quinta-feira, 30 de junho de 2011

CERTA NOITE DE JUNHO

            Faz frio e a noite está alfinetada de estrelas. É sempre assim nesta época do ano. Pode-se notar no espaço infindo bilhões de pirilampos prateados. São mundos distantes, ainda inatingíveis.

             Muitos serão habitados por seres inteligentes.
 Quem viveria neles? Homens, mulheres, animais, tal como conhecemos? Abrigarão mares e rios, florestas e pássaros? Ou tudo será diferente, superior à nossa imaginação?
         A atmosfera terrena acolhe balões multicoloridos. São outros tantos astros, estes sim, artesanais, portadores de alegrias infantis e esperanças passageiras. Todos cairão a seguir, sem forças para permanecerem no espaço. Enquanto não descem, enfeitam nosso firmamento e amedrontam matas e metrópoles. Recebem nomes interessantes – balão almofada, charuto, pião... Muitos, formosos, carregam lanternas ou bilhetes de amor, aramados nas bocas fumegantes
É tempo de festa caipira nas montanhas sertanejas.
A cidade grande mal lhe percebe a boniteza. Nada se iguala ao arraial acolhendo a simplicidade de moçoilas dançantes com seus vestidos rendados, laços vermelhos à cintura e o musicar das sanfonas. Os homens agasalham-se como podem. São as desigualdades da vida, construída nas enganações da sorte e da fortuna.
As noites de junho são como as tardes de maio. Plácidas, serenas, tenras, envolventes, portadoras de paz e de felicidade aos corações singelos.
É neste ambiente de nostalgias e de saudade não dominadas, que se realizam as festas dos Santos maiores – Antonio, casamenteiro. João, o bem amado. Pedro, sentinela do reino, pescador de almas. Cada qual tem seus adeptos, cada qual a devida homenagem.
O cronista prefere a festa de São João.
Não sei o motivo da preferência. Talvez pela figura do Santo. Rubicunda. Cabelos encaracolados. O branco e lanhado cordeiro nos braços.
Gosto mesmo é dos foguetes de lágrimas, do pipocar dos rojões, das batatas roxas assadas na brasa, do quentão de boa cachaça recendente a gengibre e canela, das flores que alegram os cabelos sedosos das donzelas casadoiras, do mastro de pau-de-sebo, das bandeirolas ao vento, do bailado das quadrilhas, dos doces de abóbora, dos pés-de-moleque, do cheiro da carne a tostar nas grelhas da fogueira construída com maestria por quem, num átimo de coragem, pretende saltar sobre suas chamas.
Tenho um xodó especial pelo dedilhar de violas dolentes e os cantares afinados dos seresteiros com sotaque interiorano.
Existe no mundo algo semelhante?
            Cultivo a impressão de estar na ante-sala onde residem arcanjos e querubins.
Tudo é maravilhosamente modesto, isto é, tão bom!
            Nos festejos juninos reencontro a infância perdida vida afora.
Ao saborear uma cocada-de-fita recordo da velha Ambrósia, cozinheira; em cada paçoca a presença de Idalina, briosa portuguesa que deixava às escondidas, num canto da sala de almoço, mil guloseimas para o menino não dormir sem matar desejos de criança.
            Em breve será Noite de São João.
Uma noite comprida, repleta de estrelas.
Terminará ao nascer da aurora. Enquanto sol não brilhar haverá pinhões e pipocas. Milho torrado. Biscoitos de polvilho azedo. Broinhas de fubá. Compoteiras cheias de doces e geléias. Gulosas tentações.
           Seguindo o casal, dezenas de pares acompanharão as figuras do pároco e do delegado.
           Vai-se arrastar o ao som de sanfonas gementes. O moço beijará a menina com aroma de  flor-do-campo, perfume de mulher. O velho pulará a labareda, em fase de extinção, pensando na juventude. O coreto da Praça, todo iluminado, abrigará o grupo musical executando, com esmero, valsinhas brasileiras. O cortejo sairá da igreja improvisada com o noivo de botinas e chapéu de palha, pito acesso junto à boca de poucos dentes, manquitolando em companhia da noiva, lábios de carmim.
O arraial vibrará de alegria. O busca-pé assustará as vetustas salientes.
algum recanto do céu, a esta altura São Janjão, pedirá aos serafins, que silenciem as trombetas para melhor ouvir o alarido na festança de seus devotos...

Nenhum comentário:

Postar um comentário